Crítica | Apaixonada
Autoconsciente de suas intenções, filme de Natalia Warth tem o coração no lugar certo, mas não sai do óbvio
“Eu sei o que vocês estão pensando”.
Em uma de suas quebras de quarta parede, a protagonista de “Apaixonada” provoca o público, segundos antes de convidar um homem para sair. A situação é óbvia, clichê. Todos esperam que ela faça o convite. E, de fato, ela faz.
Longa-metragem de estreia da diretora Natalia Warth, que já tem uma vasta experiência em novelas e séries, “Apaixonada” é um filme muito autoconsciente. Sabe exatamente o público que pretende atingir e os gatilhos que precisa acionar. Isso não significa, no entanto, que o resultado seja satisfatório. Estrelado por Giovanna Antonelli, a obra chega aos cinemas nesta quinta-feira (7).
A premissa não é nova. Uma mulher com vida aparentemente estável vê seu mundo virar de cabeça para baixo quando o marido pede o divórcio. A partir daí, ela embarca numa jornada de descobrimento e autocuidado, muitas vezes culminando em novas paixões ou chegando a conclusão de que não é preciso um relacionamento romântico para ser feliz. “Comer, Rezar, Amar” (2010) e “Sob o Sol Toscana” (2003) são exemplos de filmes com tal premissa.
Em “Apaixonada”, a crise de Bia (Giovanna Antonelli) começa depois de sua filha sair de casa para fazer faculdade na Argentina, o que finalmente deu “coragem” para seu marido Alfredo (Danton Mello) pedir a separação. Imediatamente, entra em cena o núcleo de apoio para ajudar a protagonista a perceber que estava num relacionamento ruim, e que agora é o momento de viver novas experiências, fazer terapia e, de preferência, transar bastante.
O problema do filme não é contar uma história batida, mas sim o fato de que não entrega nada de novo. A quebra de quarta parede é uma tentativa de aproximar o público dos pensamentos da protagonista. Poderia ser um diário, um podcast, um vídeo de YouTube, qualquer outra coisa. Utilizar a quarta parede não traz nenhuma grande sacada porque a protagonista é extremamente volátil. É difícil entender o que ela quer porque, veja só, ela também não sabe.
Por consequências, os comentários direcionados ao público soam desconectados da personagem que vemos em cena. É como se ela ignorasse as próprias limitações emocionais do momento vivido, se colocando quase como uma espectadora da própria história. Não existe nenhum momento de assombro ou de estupefação realmente genuíno, como algumas das melhores sequências da série “Fleabag”, por exemplo.
A forma como as outras personagens dizem ver a protagonista também é deslocada da realidade. Como o affair argentino de Bia, que fica absolutamente encantado com ela, mas sem nenhum motivo para além do fato dela ser bonita. É a única conclusão possível, já que o roteiro nos entrega pouquíssimos diálogos entre o casal. A montagem alterna cenas de passeio deles por Buenos Aires e, com isso, a audiência precisa comprar a paixão do argentino. É algo muito frágil.
Não vemos a tal mulher confiante que os pretendentes amorosos de Bia dizem ver, ao passo de que também não vemos a mãe no “modo automático”, como acusado pela filha durante uma briga. Temos uma personagem perdida num limbo de roteiro, alternando emoções de acordo com influências externas. Dialoga com a conclusão, é verdade, mas causa desconforto do ponto de vista narrativo.
O drama com a filha, a morte repentina do pai – num uso bem básico de plano holandês, diga-se de passagem -, o vai e volta com o marido. Tudo transcorre da forma como você espera. O texto também não contribui com a atuação de Giovanna Antonelli, que parece sempre um tom acima do que o momento pedia.
Mesmo com problemas, “Apaixonada” ao menos chega num desfecho coerente, e isso diz muito sobre o filme como um todo: o coração está no lugar certo, mas a execução não consegue tornar a jornada interessante.
Nota: 2 de 5.
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