Criticada pela 'demora', Academia Brasileira de Cinema abre inscrições para o Oscar
Comissão presidida por Bárbara Paz definirá o escolhido em 23 de setembro, enquanto outros países já concluíram processo; leia a análise
ATENÇÃO: Este texto foi atualizado em 20 de agosto de 2024 devido ao anúncio da Academia de que as inscrições foram prorrogadas até o dia 26 de agosto. O prazo original era 20 de agosto.
A Academia Brasileira de Cinema abriu nesta terça-feira (6) as inscrições para os filmes que pretendem concorrer a uma vaga entre os indicados na categoria de Melhor Filme Internacional do Oscar de 2025. As inscrições vão até o dia 26 de agosto e podem ser feitas no site da Academia.
A Comissão de Seleção será presidida pela cineasta e atriz Bárbara Paz. Ao todo, o grupo é composto por 25 membros titulares. Podem ser inscritos filmes que estrearam em salas de cinema entre 1º de novembro de 2023 e 30 de setembro de 2024 e estiveram em cartaz por pelo menos sete dias consecutivos em cinemas comerciais.
A primeira reunião da comissão ocorre no dia 16 de setembro, quando será definida uma shortlist de seis títulos. Depois, em 23 de setembro, o grupo se reúne novamente para decidir qual filme brasileiro tentará uma vaga na 97ª edição do Oscar, que será realizado em 2 de março de 2025.
Nas redes sociais, já é possível ver críticas à Academia por conta da “demora” em iniciar o processo de escolha. Não é de hoje que o modelo de seleção brasileiro é criticado por jornalistas e representantes do setor, já que o calendário apertado dificulta o processo de distribuição internacional do representante brasileiro.
O passado recente é gritante. Em 2022, “Marte Um” foi selecionado para a disputa em 5 de setembro. O longa sequer tinha distribuição internacional garantida naquele momento, o que praticamente matou qualquer chance de campanha.
Já no ano passado, novamente em setembro, “Retratos Fantasmas” foi escolhido depois da Academia inaugurar o modelo de shortlist. A escolha era óbvia pensando no potencial internacional do longa, mas poderia ter sido tomada com antecedência.
E esta é a questão central: antecedência. Neste momento do ano, o cenário ideal era já ter o candidato escolhido para viabilizar uma campanha internacional e aproveitar o timing de festivais internacionais, como Veneza e Toronto.
Pensando em cenários hipotéticos. Em 2023, um dos candidatos brasileiros que estavam na disputa era “Pedágio”, que teve sua estreia no Festival de Toronto. Qual teria sido o impacto comercial de ter o longa fazendo sua première mundial já como representante do país?
É algo óbvio: a Academia Brasileira de Cinema precisa pensar mais estrategicamente e antecipar a escolha se quiser que o país tenha alguma chance de entrar para a pré-lista do Oscar. Para ser lembrado e ter chances reais, é necessário que os filmes tenham exibições especiais para votantes e espaços publicitários em publicações especializadas. É preciso tempo, dinheiro e parceiros internacionais.
A nossa Academia não faz nenhum tipo de assessoria para o escolhido, tampouco investimento financeiro. Uma reportagem do Estadão, do início deste ano, traz declaração da presidente do órgão, Renata Magalhães, citando que a Academia oferece “ações que beneficiam os produtores”, como uma sessão gratuita para votantes em Los Angeles.
Na mesma matéria, representantes de “Marte Um” e “Deserto Particular” (o escolhido em 2021) reclamam da falta de suporte. Se o auxílio financeiro não é possível, e os contatos são limitados, o que a Academia pode e deveria oferecer? Mais tempo para a campanha. Há outros problemas em termos de apoio para os escolhidos, como o baixo financiamento ofertado pela Ancine (Agência Nacional do Cinema), mas isso é assunto para a outra hora. Aqui, a questão é o papel da Academia.
Para este ano, um dos filmes que surge como favorito para a candidatura é “Ainda Estou Aqui”, de Walter Salles, que terá sua première na competição pelo Leão de Ouro do Festival de Veneza, que ocorre de 28 de agosto a 7 de setembro. Na sequência, também será exibido no Festival de Toronto, que vai de 5 a 15 de setembro
Ninguém sequer viu o filme até o momento, então como pode ser favorito para representar o país? Porque Walter Salles tem conexões e o longa já conta com distribuição nos Estados Unidos. Porque é o diretor de “Central do Brasil” e porque seu novo filme traz de volta Fernanda Montenegro. É uma campanha pronta.
Veja: não é nem uma questão de gostar do diretor enquanto pessoa (sabemos das críticas que ele recebe dentro da bolha cinéfila e de seus próprios pares), mas é um raciocínio quase matemático.
Novamente, a mesma pergunta: qual seria o impacto de “Ainda Estou Aqui” chegar nesses festivais já com a “validação” de ser o candidato brasileiro? Pode ser que o filme seja ruim? Evidentemente.
O que não dá é para esperar até setembro para escolher um candidato. Caso o escolhido não seja o filme de Walter Salles, quão preparado para a campanha o nosso candidato estará?
Ou teremos mais um caso “Marte Um”, que sequer decolará (e não por culpa do filme, que é maravilhoso), ou teremos que depender dos nossos cineastas já consagrados e que andam pelas próprias pernas, como Karim Aïnouz e seu “Motel Destino”, que já tem o carimbo de ter disputado a Palma de Ouro de Cannes neste ano.
Paralelamente, outros países já bateram o martelo e definiram seus candidatos para a disputa de Melhor Filme Internacional. A Áustria selecionou “The Devil's Bath”, enquanto a Irlanda escolheu “Kneecap”. Ou seja: a corrida já começou.
O Brasil precisa de um Oscar? Não, nosso cinema não depende disso. Porém, se você se propõe a competir, que trace um planejamento que ao menos permita que seu representante brigue pela vaga. Senão é só tempo perdido.
Confira a Comissão de Seleção do Oscar 2025
Allan Deberton (CE), Andre Pellenz (RJ), Bárbara Paz (RJ), Bernardo Uzeda (RJ), Bia Oliveira (RJ), Carol Bentes (RJ), Cíntia Domit Bittar (SC), Diogo Dahl (RJ), Edson Ferreira (ES), Eloisa Lopez-Gomez (SP), Flavio Tambellini (RJ), Gabriel Mellin (RJ), Gláucia Camargos (RJ), Ilana Brakarz (RJ), Leo M. Barros (RJ), Lô Politi (SP), Lucy Barreto (RJ), Malu Miranda (RJ), Marcelo Serrado (RJ), Monica Trigo (SP), Plinio Profeta (RJ), Renata Martins (SP), Sandra Kogut (RJ), Gal Buitoni (SP) e Alfredo Alves (MG).
Para se aprofundar: vídeo do professor e jornalista Waldemar Dalenogare, que acompanha o tema há anos e integrou a comissão anteriormente:
A newsletter tem página no Instagram! Também estou no Twitter falando sobre cinema e outros devaneios.
E, como sempre, me siga no Letterboxd para ler sobre filmes internacionais 🍿